Artigo de Letícia Piccolotto no JOTA: como políticas públicas podem estimular a formação de profissionais digitais

Boas experiências indicam necessária união entre diferentes atores da sociedade em prol do trabalho colaborativo; confira o artigo da CEO do BrazillAB
Em 28 de December de 2020

Profissionais digitais são carreiras que estão em alta no país. A Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom) traçou uma projeção no período entre 2018 e 2024 no setor. Mais de 420 mil postos de trabalho devem ser criados nesse intervalo, resultando na demanda de mais de 70 mil novos profissionais até 2024. A formação, contudo, ainda não acompanha esse crescimento. Análises com dados do INEP sobre as carreiras tecnológicas mostram que o Brasil consegue formar apenas 46 mil pessoas anualmente nessas áreas, com grande concentração geográfica no estado de São Paulo e falta de diversidade com baixa presença de mulheres e negros, por exemplo.

Isso nos leva a um importante questionamento: como superar o gap entre oferta e demanda de profissionais com habilidades digitais no Brasil? A CEO e Fundadora do BrazilLAB, Letícia Piccolotto, escreveu a respeito desse assunto em seu artigo no JOTA, na coluna Inova & Ação, e compartilhou algumas ações que o BrazillAB tem desenvolvido para contribuir com esse esforço. Confira abaixo o artigo na íntegra:

 

Como políticas públicas podem estimular a formação de profissionais digitais

Criar uma solução tecnológica não é muito diferente do que construir uma casa: exige estudo, preparo e competência dos profissionais responsáveis. É preciso, portanto, que haja pessoas que possam conduzir a transformação digital e garantir que os diversos produtos e serviços tecnológicos sejam ofertados.

Esse, sem dúvida, é o maior desafio enfrentado pelo Brasil: a demanda pelos profissionais digitais é muito maior do que a capacitação e formação existentes. É como se o país tivesse uma grande necessidade de casas, mas ninguém para erguê-las.

Os serviços digitais estão em alta justamente pelas facilidades que a tecnologia trouxe para o dia-a-dia da população nas últimas décadas. Se no início da década de 1990 ainda era inimaginável alguém utilizar um celular na calçada de uma cidade, hoje podemos não só ligar para alguém, como responder mensagens, pedir um carro compartilhado e realizar compras com esse aparelho revolucionário.

Essas inovações foram possíveis porque pessoas idealizaram um projeto, identificaram problemas, desenharam soluções e, principalmente, trabalharam arduamente para que virassem realidade. Aquela visão de grandes ideias que surgem espontaneamente é restrita apenas à ficção. No mundo real, os profissionais digitais são os que estão mudando o mundo.

São carreiras que estão em alta no país. A Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom) projeta que, no período entre 2018 e 2024, mais de 420 mil postos de trabalho devem ser criados no setor digital, movimento que demandará mais de 70 mil novos profissionais por ano até 2024.

A formação, contudo, ainda não acompanha esse crescimento. Análises com dados do INEP sobre as carreiras tecnológicas mostram que o Brasil consegue formar apenas 46 mil pessoas anualmente nessas áreas, com grande concentração geográfica no estado de São Paulo e falta de diversidade, já que a presença de mulheres e pessoas negras ainda é baixa. Desse desalinhamento entre demanda e oferta, nasce um cenário preocupante: caso nada seja feito, o déficit pode atingir o número de 300 mil profissionais digitais até 2024.

Mas como evitar que esse gap entre a oferta e demanda de indivíduos com habilidades digitais se aprofunde e atrase – ainda mais – a transformação digital no Brasil?

 

Como essa ideia é trabalhada lá fora?

O desafio de formar profissionais digitais em quantidade e qualidade não é somente vivenciado pelo Brasil. Isso é o que mostra um estudo realizado pelo BrazilLAB e pela Fundação Brava, em parceria com o Centre for Public Impact (CPI).

A pesquisa mapeou 32 experiências internacionais de 14 países e aponta que as nações têm utilizado duas principais estratégias para fortalecer o ecossistema de profissionais digitais: formar profissionais nacionalmente e/ou atrair trabalhadores especializados de outras nações.

Cingapura é um caso único de valorização do digital. O pequeno país asiático se transformou em um importante pólo tecnológico em todo o mundo. Hoje, abriga algumas das maiores empresas de tecnologia do planeta e é o segundo país mais fácil de fazer negócios, segundo ranking do Banco Mundial.

Para dar conta dessa demanda, o país instituiu o TechSkills Acelerator (TeSA), uma iniciativa entre Governo, indústrias e o Congresso da União Nacional do Comércio (NTUC). O objetivo era capacitar quem já trabalha na área e formar novos profissionais. Em 10 meses, mais de 8 mil pessoas foram treinadas, segundo o Ministério de Comunicação e Informação de Cingapura.

Outras iniciativas semelhantes florescem na Europa. Os Países Baixos criaram um programa chamado “Geef IT Door” ou “Passe a TI adiante”. O objetivo é incentivar jovens a seguirem carreiras de tecnologia, a partir da conexão entre alunos do ensino médio e profissionais digitais, que despertam o interesse deles para estudarem e trabalharem nesse setor.

Já a França busca fomentar o ecossistema de startups, criando pólos de excelência para o desenvolvimento de serviços digitais. O Canadá, por sua vez, está focado em estratégias para aumentar a mobilidade internacional, facilitando a obtenção de vistos para profissionais digitais entrarem no país.

 

Como passar da teoria para a prática no Brasil 

As boas experiências que chegam do exterior apenas reforçam uma percepção já latente no Brasil: a necessária união entre diferentes atores da sociedade em prol de um trabalho colaborativo.

Poder público, iniciativa privada e sociedade civil devem unir forças para encontrarem as melhores soluções de formação de profissionais digitais.

É fundamental, ainda, combinar estratégias de curto, médio e longo prazo. Há a necessidade de realizar uma educação inicial, fornecendo o conhecimento necessário para que jovens possam aprender as principais técnicas do setor. Mas é preciso também montar um programa de especialização e atualização para promover uma evolução contínua no mercado de trabalho.

Nesse sentido, é função do poder público desenvolver uma base curricular que fomente o ensino das habilidades digitais. Essa estratégia inclui desde a inserção do tema em aulas do Ensino Fundamental e Médio até a formação de escolas técnicas e cursos universitários com diferentes níveis de aprendizado.

As organizações privadas, por sua vez, devem zelar por programas de capacitação de profissionais, além de estimular projetos que possam explorar novos talentos e firmar parcerias com instituições de ensino. Já a sociedade civil pode contribuir de diversas formas para o ecossistema de profissionais digitais, desde a concepção e oferta de metodologias inovadoras de formação, até mesmo fortalecendo a pesquisa sobre o tema.

O mais importante é reconhecer que esse é um desafio complexo que impacta a toda a sociedade. Sendo assim, é fundamental o envolvimento dos mais diversos atores na busca de soluções.

 

O digital como agenda prioritária para o Brasil

Algumas iniciativas inovadoras começam a ser adotadas no esforço de ampliar o número de profissionais digitais no país. Cursos intensivos, voltados ao upskilling ou reskilling, contribuem para a formação de profissionais no curto prazo.

Mudanças na Base Nacional Comum Curricular, do MEC, propõem a inclusão de temáticas digitais já no ensino básico. Organizações criam iniciativas que estimulam a formação digital em determinadas regiões, como o Porto Digital de Recife (PE).

E a sociedade civil se organiza e cria soluções inovadoras como a Alpha Edtech, projeto liderado por BrazilLAB, Fundação Brava, Instituto Alpha Lumen e Fundação Behring. A Alpha Edtech é uma startup social que tem como objetivo formar jovens talentosos em situação de vulnerabilidade e que desejam trabalhar com tecnologia, mas não têm condições de pagar por um curso ou se dedicar a uma formação gratuita em tempo integral. A iniciativa oferece remuneração aos estudantes e garante emprego ao final dos três semestres de curso aos desenvolvedores.

A transformação digital é uma pauta prioritária para o país. Caso queiramos aproveitar todos os resultados positivos de sua plena implementação, precisamos investir nas pessoas que serão responsáveis por fazê-la uma realidade. O desafio de formar esses profissionais começa hoje.

Confira o artigo no site do JOTA.

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