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As lições aprendidas na implementação de Aceleradoras Corporativas

O mentor do BrazilLAB, Franklin Ribeiro, escreve artigo para o site InovativaBrasil. As corporações têm percebido que não basta depender apenas de pesquisa e desenvolvimento dentro da organização.
Em 27 de November de 2017

As corporações têm percebido que não basta depender apenas de pesquisa e desenvolvimento dentro da organização. No contexto atual, as startups apresentam as seguintes vantagens em relação às grandes corporações, sejam: agilidade organizacional, potencial para ideias promissoras, vontade de tomar risco e crescimento rápido. Por outro lado, as corporações têm conhecimento da indústria, experiência de mercado, economia de escala, redes de contato estabelecidas, marca conhecida e, portanto, recursos complementares para criar um negócio. Por isso, o aproveitamento de ambos os pontos fortes apresenta-se como uma oportunidade para ampliar o relacionamento entre corporações e startups. Vejamos a seguir, algumas lições aprendidas, ações recomendadas e fatores de sucesso, que, serão classificadas utilizando quatro dimensões: proposição, processo, pessoas e posicionamento.

1. Proposição: O que o programa oferece e a relação entre a startup e a corporação.

1.1 Definir Objetivos Estratégicos: Os objetivos das corporações que pretendem se relacionar com startups tendem a ser: rejuvenescer a cultura corporativa, resolver um desafio corporativo, expandir para mercados futuros, atrair e reter talentos, preencher lacunas de inovação no negócio atual ou tornar a marca mais inovadora. As incubadoras e aceleradoras têm alto grau de adequação com os objetivos de rejuvenescer a cultura corporativa para criar uma mentalidade empreendedora nos funcionários e tornar a marca mais inovadora para atrair clientes, parceiros e novos talentos.

1.2 Entender características culturais da corporação: Sabendo que 90% dos programas de inovação corporativos falham nos primeiros 18 meses por causa da cultura corporativa de reação ao risco e às mudanças, identificou-se a necessidade de se entender previamente os aspectos da cultura corporativa relacionados à inovação, ao apetite aos riscos e às reações às mudanças e adaptar o modelo de inovação de acordo com esse arcabouço.

1.3 Identificar desafios e capacidades internas: Os desafios estratégicos devem ser levantados através de times multifuncionais e da liderança, e o resultado deve ser comparado com as capacidades dos recursos internos, a partir disso, a corporação identifica as lacunas de competência para buscar as oportunidades externamente.

1.4 Foco em um setor/tema específico: Quando a corporação define um setor/tema específico e seleciona startups que atendem a essa demanda, os times de empreendedores que fizeram parte desse processo seletivo conseguem compartilhar o conhecimento sobre os problemas comuns e as tecnologias relacionadas, além disso, o foco em um setor específico facilita a interação com investidores e parceiros especializados.

1.5 Considerar ganhos de curto prazo: No começo de um programa de aceleração de startups, a corporação deve focar em ganhos de curto prazo, através da conquista de inovações incrementais. Essa abordagem permitirá à organização desenvolver competências que darão suporte para transformações maiores.

1.6 Alinhar expectativas com as startups: As startups podem ter as seguintes expectativas na relação com as corporações: acesso a recursos, financiamentos, competências especializadas, mercados e o aumento da sua credibilidade, além de esperarem que a corporação apresente vontade de ajudar, agilidade nos processos e transparência sobre as suas motivações. Por isso, é importante que a corporação alinhe essas expectativas desde o começo. Credibilidade é chave em uma comunidade conectada de startups e, para manter a reputação, a corporação deve diminuir o receio das startups deixando claro o que pretende com a relação.

1.7 Não exigir participação imediata: Do lado das startups, obter uma participação muito significativa pode reduzir o espírito empreendedor e a sua atratividade para futuros investidores. Do lado da corporação, a não exigência de equity, resulta em menor esforço de investigação (due diligence) permitindo avaliar uma quantidade maior de oportunidades e escalar o programa de forma mais rápida.

1.8 Desenvolver Key Performance Indicators (KPIs) e obter feedback contínuo: Recomenda-se a inclusão de métricas chave (KPIs) de longo prazo e a captura de feedback com frequência para medir o progresso do programa e melhorá-lo continuamente.

2 Processo: Considera as características de execução do programa.

2.1 Manter um ciclo curto de duração: A duração do programa deve ser curta (entre 3 e 6 meses). Essa limitação força o foco dos empreendedores e dos recursos que a corporação dedica à aceleradora, contribuindo para a alta produtividade do time e um resultado mais rápido sobre o crescimento ou fracasso da startup. No entanto, existem exceções de acordo com o segmento, aceleradoras de startups de hardware ou de saúde, podem exigir uma duração maior do ciclo de aceleração.

2.2 Oferecer um programa customizado: As corporações que oferecem um programa de aceleração customizado às necessidades e aos objetivos previamente identificados das startups, apresentando alguns eventos mandatórios e outros voluntários, contribuem para que os times não desviem seu foco e elimina a ameaça de reduzir o espírito empreendedor.

2.3 Oferecer conteúdo para o desenvolvimento dos modelos de negócio: Entre os conteúdos mais relevantes apontados para as aceleradoras corporativas que admitem startups em estágio inicial deve se considerar as particularidades do método lean startup e na validação do modelo de negócios com potenciais clientes. Além disso, é importante um amplo treinamento em pitch.

2.4 Simplificar as relações com as startups: é crucial simplificar procedimentos organizacionais para se ajustar ao ritmo mais ágil das startups, protegendo-as das complexidades e burocracias corporativas, descentralizando a tomada de decisão e simplificando as formalidades. Sugere-se também alocar uma pessoa com poder de decisão e orçamento para cada startup que tiver relacionamento e disponibilizar um time que conhece bem a organização e será o ponto focal para facilitar o acesso aos programas e a outras unidades de negócio.

Alguns exemplos de processos que podem ser simplificados são: reduzir os prazos de pagamento para startups, facilitar o registro como fornecedor qualificado da corporação e adotar um modelo contrato simples amigável aos empreendedores. Os players do ecossistema e as startups acabam sabendo se a corporação não é aberta à colaboração.

2.5 Prevenir-se sobre questões de propriedade intelectual: Se a startup trabalha em um produto que será integrado aos sistemas da corporação e a divisão de tarefas é clara, a propriedade intelectual do seu produto deve ser naturalmente dela, separado da propriedade intelectual do sistema da corporação. No entanto, se for necessário uma abertura maior da tecnologia core é mandatório assinar um acordo de confidencialidade (NDA). Se a divisão das interfaces técnicas de ambos não for facilmente identificável, é necessário resolver cada questão relacionadas à propriedade intelectual em um acordo de desenvolvimento conjunto antes do projeto começar.

2.6 Colaborar com as startups já aceleradas: Ao final do programa, caso as corporações não concretizem parcerias, projetos pilotos ou a aquisição das startups, elas devem continuar colaborando, de alguma forma, com as startups aceleradas. Umas das formas é através da parceria com outras organizações que podem oferecer oportunidades complementares ao programa.

3 Pessoas: Como lidar com os recursos humanos envolvidos.

3.1 Obter compromisso dos executivos: Destaca-se a importância dessa ação, antes da implementação do programa, gerando, como consequência, um maior comprometimento e confiança dos empregados envolvidos em colaborar com as startups.

3.2 Comunicar benefícios da mudança e expectativas de resultados: A comunicação prévia dos benefícios e resultados esperados para a corporação tem um papel relevante para diminuir a resistência às mudanças. Há que se considerar que um número reduzido de startups pode ser viável para a empresa ao final de um programa, portanto é importante que a expectativa de um resultado como esse seja compartilhada. Outra forma de reduzir a resistência às mudanças é aumentar o número de participantes e apoiadores envolvidos com o programa e reforçar a importância da corporação pensar o que os clientes irão querer no futuro.

3.3 Selecionar gerente com perfil específico: O gerente do programa terá um papel duplo facilitando o acesso das startups às pessoas certas dentro da organização e garantindo que inovações externas sejam usadas internamente. O perfil desse gerente deve apresentar algumas características como humildade, determinação, perseverança e mindset empreendedor, tratando as startups como parceiros ao invés de empregados.

3.4 Conectar-se previamente com a unidade de negócios: É recomendável que o gerente envolva a unidade de negócios corporativa o quanto antes, para identificar os desafios gerenciais, mitigar os riscos de integração com a unidade de negócio após o término do programa e garantir o suporte interno dos empregados.

3.5 Ampliar o networking: O desenvolvimento do networking é um importante recurso para as aceleradoras, podendo ser feito através de eventos, interações regulares, formação de consórcio com outras corporações e a criação de laços com especialistas externos. As conexões permitirão ter acesso a profissionais que possam oferecer feedback para desenvolver as startups e pode ajudar no engajamento da comunidade em que a aceleradora está inserida. Além disso, a disponibilização de mentores externos e internos à corporação viabiliza o compartilhamento de conhecimento sobre a corporação e a indústria com as startups.

3.6 Firmar parcerias com o ecossistema de apoio as startups: Além de auxiliar na atração de startups, a criação de relacionamentos de confiança com venture capitalists, universidades, incubadoras e outras aceleradoras facilita ser reconhecido como um player confiável. A construção de parcerias com o ecossistema amplia a possibilidade de alcançar inovações disruptivas, permitindo “explorar o oceano ao invés de construir um aquário”. Os programas corporativos devem demonstrar abertura ao ecossistema e não encará-los como competidores por startups.

4 Posicionamento: Refere-se à localização e ao ambiente da aceleradora corporativa.

4.1 Escolher local de acordo com nível de envolvimento corporativo: Existem 4 opções que se adequam de acordo com o nível de envolvimento e controle que a corporação deseja. A aceleradora corporativa pode estar fisicamente dentro ou fora da organização, além de poder se posicionar como uma entidade independente ou até mesmo virtual. Essa última opção permite um alcance global, mas é importante balancear os benefícios e ter alguma interação presencial. A medida em que a opção seja mais distante e independente da corporação, a startup tende a ter maior autonomia, mas a influência/poder e a facilidade de acesso aos recursos da corporação diminuem. A corporação ainda pode ganhar experiência se associando a uma aceleradora existente, antes de investir em uma unidade própria.

4.2 Criar um ambiente inspirador: O design do espaço físico ajuda a criar um ambiente amigável para estimular uma atmosfera empreendedora.

Resultado da pesquisa no ambiente brasileiro

Com base em entrevistas realizadas com 3 corporações e com 3 startups participantes dos respectivos programas de aceleração, serão apresentadas as semelhanças e diferenças em relação às lições aprendidas e ações recomendadas, nos casos estrangeiros.

5 Proposição

A tabela abaixo apresenta, de forma simplificada, os achados relacionados à dimensão de Proposição, separando-os entre o que é semelhante e o que diverge das lições aprendidas e ações recomendadas.

Proposição – Semelhanças e diferenças dos casos brasileiros com as recomendações estrangeiras

Ação Semelhança Diferenças 3
1) Conhecer os objetivos estratégicos Todos os casos estudados reconhecem que podem atingir diferentes objetivos estratégicos por meio das aceleradoras. Não foi observado um foco nos principais objetivos estratégicos recomendados para aceleradoras.
2) Compreender as características culturais organizacionais Os gestores demonstraram entender as características culturais da corporação. Apesar da compreensão das características, não foi explicitado alguma adaptação cultural significativa da corporação para alinhar-se às necessidades das startups.
3) Identificar desafios e capacidades internas Uma das aceleradoras identifica capacidades internas e desenvolve um planejamento para 5 anos antes de escolher as startups que complementem o portfolio. Foram observados dois outros níveis de abordagem: Um caso que não avalia a capacidade interna antes do programa de aceleração e o outro que apenas identifica tendências do setor.
4) Focar em setor específico Apenas uma das aceleradoras foca em um setor específico. As aceleradoras que não focam em um setor específico acreditam que a concorrência de startups de um mesmo setor inibe as potenciais sinergias.
5) Considerar ganhos de curto prazo Para aumentar as chances de ganhos de curto prazo, são selecionadas startups de setores que tem a probabilidade de retorno mais a curto prazo. Apesar da possibilidade de ganhos de curto prazo ser desejável, é importante contrabalancear startups de potencial maior que dão retorno a longo prazo.
6) Alinhar expectativas com startups As aceleradoras declaram realizar um alinhamento inicial, onde informam sobre o programa e avaliam com mais detalhes as startups. Os dados apontam para uma maior necessidade de se “ouvir os empreendedores”. Seria preciso estabelecer-se uma relação de efetiva “co-criação”.
7) Não exigir participação imediata Todas as aceleradoras estudadas não exigem participação imediata, mas firmam uma opção de compra futura. Observa-se que uma das aceleradoras oferece opção de compra de um percentual significativo quando a startup pode se tornar uma unidade de negócios da corporação.
8) Desenvolver indicadores de desempenho Todos os casos definem KPIs e monitoram o desempenho. Definir KPIs com a participação da startup além da corporação.

 

5.1 Tem objetivos estratégicos diversos:

Apesar de reconhecerem diversos objetivos estratégicos possíveis com as aceleradoras, um dos gestores entrevistados reforçou que não tem objetivo de retorno financeiro com a venda das startups, “não é uma estratégia de investimento na saída exit, como é o investidor de capital de risco”. Os estudos apontam que os objetivos mais adequados para uma aceleradora são rejuvenescer a cultura corporativa e tornar a marca mais inovadora. Esses dois objetivos não foram apresentados como os principais por nenhuma das aceleradoras pesquisadas.

5.2 Conhecem as características culturais corporativas mas não houve adaptação significativa: As corporações demonstraram conhecer os aspectos relativos às suas próprias características culturais, em um dos casos, há o reconhecimento de que é necessário “harmonizar essas duas vertentes que a empresa tem. É extremamente conservadora no seu operacional, e também ela é muito ambiciosa na sua parte estratégica”. Porém nenhuma corporação apresentou adaptação significativa no seu modelo de inovação. Um exemplo da falta de adaptação foi mencionado por um dos empreendedores, que gostaria de trabalhar de bermuda. No entanto, não era permitido acessar o prédio da corporação com esse traje. A solução encontrada pelo empreendedor foi: “você chega de calça, e você troca e coloca bermuda, trabalha de bermuda”.

5.3 Distintas abordagens na avaliação de capacidades internas para identificar desafios a serem resolvidos com startups: As 3 aceleradoras corporativas apresentaram diferentes abordagens. Há caso em que não é feito nenhuma avaliação das capacidades internas, há quem apenas identifica oportunidades em determinados setores, e por fim, em uma das corporações, “é feito um roadmap da linha de produto, de até 5 anos. Caso não esteja previsto o desenvolvimento interno, há uma oportunidade de complementação do portfolio com startups, é levando em consideração o time-to-market, para adiantar o roadmap”. Ou seja, é feito uma programação de longo prazo, avaliando o que é mais rápido realizar através da inovação aberta.

5.4 Não focam em um setor/tema específico: O foco do programa de aceleração em apenas um setor específico pode inibir potenciais sinergias, pois tratariam de startups concorrentes que“…se for muito próximo pode criar muito um espírito de contenção de informação.”. Essa mesma postura foi encontrada em outra aceleradora pelo motivo de que acredita que faltaria maturidade no mercado brasileiro para conseguir reunir startups de um segmento específico. Em apenas um dos casos houve a definição de requisitos tecnológicos, mesmo assim, pareceu algo relativamente amplo “…a startup precisa integrar às redes sociais, trabalhar com análise big data, armazenar na nuvem, explorar tecnologia móvel”.

5.5 Balancear a seleção de startups que podem apresentar ganhos de curto prazo: As corporações entendem que devem considerar resultados a longo prazo. Por outro lado, enquanto um dos casos tem a expectativa de alguma receita, ainda que pequena, no curto prazo, outra aceleradora apresentou uma estratégia de balanceamento do portfólio, que consiste em selecionar algumas startups de setores que tem maior probabilidade de ganhos de curto prazo, “tem startups que faz gestão telecomunicações, que em breve já vai ter resultado, no primeiro ano já vai dar resultado, enquanto tem startups no ramo de varejo, conceitos novos do varejo, que vai demorar mais tempo”.

5.6 Equilibrar expectativas antes da aceleração durante um mês: Observou-se que em uma das aceleradoras é dado um período de um mês antes da aceleração, “onde as expectativas dos dois lados são equilibradas, para que antes que comece a aceleração, os dois lados saibam que vão batalhar juntos para tentar chegar no final em uma situação bem melhor do que começaram”. Nessa oportunidade a ideia é gerar empatia mútua, sem o comprometimento de já estar dentro do programa de aceleração. Não obstante, constatou-se que as startups manifestam querer “ser ouvidas”. Portanto, por vezes, o frequentemente citado “alinhamento de expectativas” se manifesta como unilateral sendo que a empresa, nesta interpretação, transmite à startup parceira suas próprias regras. Decorrente desta observação, deve ser testado a hipótese de que um espaço de co-criação mais colaborativa entre as aceleradoras e os acelerados tenderia a surtir mais resultados e agregar maior valor.

5.7 Opção de compra de percentual não significativo: Os percentuais de participação constantes nas opções de compra oferecidos, ao fim da aceleração, não são significativos, segundo um dos empreendedores que considera que “é mais ou menos um padrão”. Apenas em um dos casos, uma das alternativas de saída é que a startup se torne uma unidade de negócios da corporação e nesse caso o percentual de participação alcança 50%.

5.8 Proposição de KPI pelos empreendedores e mentoria sobre OKR: Uma das práticas consideradas interessante foi a possibilidade de propor KPIs em conjunto com a aceleradora. Além disso, também foi mencionado a oferta de mentoria sobre Objetive Key Results (OKR), que é uma metodologia de gestão baseado em indicadores de resultado.

6 Processo

Na tabela abaixo é possível identificar as semelhanças e diferenças em relação às lições aprendidas e ações recomendadas alocadas na dimensão de Processo, ou seja, o funcionamento do programa.

Processo – Semelhanças e diferenças dos casos brasileiros com as recomendações estrangeiras

Ação Semelhança Diferenças
1) Estabelecer ciclo curto de duração A dinâmica das startups e a busca por resultados das corporações motivam as aceleradoras a executar ciclos mais exíguos É necessário um ciclo mais longo de duração do programa para startups que comercializem com outras empresas (B2B).
2) Customizar programa segundo necessidades das startups Em geral, os programas têm uma parte customizada e uma parte padronizada. Ainda assim, foi sugerido a possibilidade de reorganizar a ordem das mentorias disponibilizadas e os horários das reuniões e compromissos do programa.
3) Ofertar conteúdo relevante para o desenvolvimento das startups Os principais conteúdos requisitados são oferecidos pelas aceleradoras pesquisadas. Foram identificados outros conteúdos importantes que as aceleradoras procuram atender através de mentorias e workshops.
4) Simplificar procedimentos da corporação Houve incipiente simplificação de processos em alguns casos, como: agilização no processo de compras, flexibilização na contratação de profissional e redução do prazo de pagamento. Para lidar com procedimentos que ainda não foram simplificados, um profissional é responsabilizado por auxiliar as startups com as barreiras da corporação.
5) Propriedade intelectual Em todos os casos a propriedade intelectual pertence à startup. Observa-se a evolução de um caso para o conceito de “governança” da propriedade intelectual.
6) Ao fim do processo, manter colaboração com startups aceleradas Todos oferecem um suporte básico sob demanda, como: acesso à base de conhecimento e à rede de relacionamentos, participação em eventos, feiras e coworking. A vinculação de metas ao sucesso da startup que já foi acelerada, é um fator que impulsiona o gestor da aceleradora corporativa para um comprometimento maior na busca de retornos financeiros.

 

6.1 Ciclo mais longo de aceleração para startups B2B: No geral, há uma preferência por períodos curtos para manter o espírito empreendedor. A exceção é quando se busca startups que vendem produtos para outras empresas (B2B). Nesse caso, o ciclo de desenvolvimento comercial é mais longo, uma venda “dificilmente se faz em menos de 60 ou 90 dias por mais simples que seja a solução” e, portanto, a aceleradora “separou aquilo que era produto daquilo era comercial, e prolongou a parte que era de aceleração comercial”. Após a primeira rodada de aceleração a aceleradora estendeu o seu programa para 15 meses.

6.2 Os programas permitem uma customização parcial: Há uma relativa customização dos programas de aceleração através das mentorias, que oferecem um apoio específico para as demandas de cada startup. Um empreendedor pontuou que a aceleradora estava aberta a entender, durante os encontros regulares, “…quais são as demandas, quais são os problemas que estão encontrando para ir acompanhando e auxiliando…”. Além disso, a participação nos workshops e eventos costuma ser voluntária, contribuindo para a flexibilidade no programa. No entanto, um empreendedor gostaria de ter opinado na ordem das mentorias, pois isso ajudaria a obter o conteúdo mais relevante no exato momento em que a startup estivesse mais precisando. O empreendedor também gostaria de “participar de forma mais ativa na decisão de horário para as agendas”, para não conflitar com a agenda de negócios da startup.

6.3 Conteúdos mais relevantes para as startups: A literatura indicou que os conteúdos mais relevantes seriam treinamento de PITCH e o método lean startup. Nos três casos, além desses conteúdos, foram mencionados aprendizados relacionados à aceleração comercial e outros temas: SCRUM (metodologia ágil para gestão e planejamento de projetos de software), Facebook ads, banco de dados, OKR, planejamento de vendas, inbound marketing, técnica de negociação, abordagem de vendas e marketing digital.

6.4 Responsabilizar alguém pela intermediação de processos não simplificados: Entre os processos que precisam ser simplificados observa-se a redução do prazo de pagamento nas compras corporativas. Por outro lado, um empreendedor entrevistado gostaria que a empresa oferecesse um preço mais baixo de seus produtos para as startups em aceleração. Também foi informado que o processo de compras foi acelerado e houve uma flexibilização na relação de trabalho entre a startup e os seus funcionários. Também foi criada a figura do anjo corporativo, que é um colaborador da corporação, que pode ser o presidente da empresa, os diretores ou executivos do conselho. O anjo, além de ser um mentor, também ajuda a resolver questões e “ajuda na nossa cultura a ceder algumas coisas…e aumenta o engajamento dentro da corporação”. A presença desse profissional que ajuda a startup a lidar com as burocracias corporativas foi observada em todas as corporações.

6.5 Propriedade intelectual é da startup, mas pode ter uma governança conjunta: As corporações adotam a premissa de que a propriedade intelectual deve pertencer à startup. No entanto, apareceu a intenção de evoluir para uma governança conjunta na propriedade intelectual, após criar um elo de confiança a mensagem da aceleradora é “fazer a cópia da chave, e deixa eu poder entrar na sua casa quando puder, se precisar”.

6.6 Disponibilizar algum suporte às startups já aceleradas: Depois que o programa de aceleração terminar, pode-se incentivar a colaboração com a inclusão de metas para o gestor do programa vinculadas aos resultados da startup, algumas possíveis metas são: levantamento de capital, saída de investimento e vendas. No geral, as corporações oferecem algum suporte, sem compromisso formal, como: acesso à base de conhecimento, acesso à rede de relacionamentos, participação em eventos, feiras e disponibilização de espaços de coworking, caso haja disponibilidade. Diferentemente da sugestão apresentada na literatura, não foi identificada nenhuma parceria com outras corporações para escalar o programa após a aceleração.

7 Pessoas

Na tabela abaixo destacam-se as semelhanças e diferenças em relação às lições aprendidas e ações recomendadas na relação com as pessoas que estão envolvidas com o programa.

Pessoas – Semelhanças e diferenças dos casos brasileiros com as recomendações estrangeiras

Ação Semelhanças Diferenças
1) Obter o compromisso dos executivos Os gestores tem ciência da importância e informaram que os principais executivos apresentam comprometimento com a causa. A conversa entre o principal executivo e empreendedores no Vale do Silício tem o potencial de catalisar a formação da aceleradora executiva.
2) Comunicar os benefícios e expectativas As aceleradoras corporativas realizam uma ação de endomarketing para comunicar os detalhes dos programas. É permitido que o funcionário reintegre o quadro caso a sua startup não tenha sucesso após o programa de aceleração.
3) Perfil do gerente O gerente deve entender como funciona as startups e o universo corporativo, sendo político em suas relações. Além disso deve ser solícito e estar disposto a ajudar. O perfil questionador ajuda também a ser inovador e ultrapassar barreiras. Há diferenças do colaborador e do empreendedor, que geram conflitos, portanto o gerente deve ser conciliador.
4) Integração prévia para mitigar riscos A integração prévia com a unidade de negócios é considerada importante para reduzir riscos futuros. Uma das formas de mitigar o risco, é exigir que a primeira venda seja para outra corporação e a startup nunca deve depender da corporação para sobreviver.
5) Ampliar o networking e parcerias A ampliação do networking é adotada para estabelecer parcerias para trocar apresentações de startups, realizar e divulgar eventos. Realizar parcerias com organizações que façam uma pré-aceleração para as startups que ainda não estejam preparadas para entrar no programa.

 

7.1 Compromisso na participação em novos negócios: A energia, o foco e o perfil dos empreendedores não só contribuem para obter o compromisso dos executivos como também tem o potencial de “despertar um desejo autêntico de participar de uma nova empresa, de um novo negócio”, consequentemente, a atitude pode gerar um contágio muito maior na corporação. A criação da aceleradora corporativa pode ser catalisada com uma missão do presidente ao Vale do Silício, aproveitando a oportunidade para conversar com diversos empreendedores.

7.2 Convite aos funcionários para minimizar resistências e aumentar engajamento: Aponta-se a importância de se comunicar previamente sobre o programa de aceleração que será implementado, dando a chance para que os próprios colaboradores desenvolvam startups e participem do programa. Essa ação pode gerar uma retenção e satisfação, ainda maior, se a corporação permitir que os funcionários voltem a integrar o quadro caso a startup não dê certo “…teve empreendedores que saíram daqui, porque não tinha como empreender de outro jeito”. Necessário também que as corporações comuniquem frequentemente os resultados das startups.

7.3 Gerente deve ter um perfil conciliador: Sobre ao perfil do gerente responsável pela operação da aceleradora corporativa, “não pode ser puramente de startup, porque é uma grande empresa, então é o mix de um cara que consegue navegar politicamente dentro de uma grande organização, mas é um cara que entenda principalmente o mercado, as fases, o ciclo de vida, consegue falar com investidor…”. Também foi apontado a importância do gerente ser questionador, ter menos compromisso com o status quo, para gerar inovação e enfrentar todas as possíveis barreiras em uma corporação. É nítido o benefício de encontrar pessoas solícitas, e isso foi confirmado no perfil da aceleradora: o compromisso em sempre querer ajudar o empreendedor e criar um sentimento de equipe. Por outro lado, o gerente também terá o papel de mediar conflitos, ele deve estar atento para questões psicológicas e saber entender as diferenças. “Às vezes o próprio pessoal da aceleradora trata o empreendedor como colaborador e simplesmente manda fazer, e não é bem por aí … lado de lá para cá também, trata atende às vezes só como investidor, e não como um sócio interessado nele”

7.4 Mitigação dos riscos através de integração prévia: A corporação deve prever ações para mitigar os riscos de integração da startup com a unidade de negócios. Por esse motivo “algumas lideranças são responsáveis pela fase de transição para acomodar essa startup”. Para reduzir os riscos, a startup não deve ter a própria corporação como primeiro cliente e posteriormente não poderá depender apenas dela para se manter. A exceção é se a solução puder ser oferecida para um concorrente, nesse caso a corporação pede a primeira oferta.

7.5 Ampliar o networking e parcerias com o ecossistema: As corporações firmam parcerias formais e informais e ampliam o networking com outras empresas, academia, fundos de venture capital, governo, município, aceleradoras e clientes. O objetivo é trocar apresentações de startups, realizar eventos conjuntos ou divulgar os eventos. Uma prática é realizar parcerias para “atrair projetos bem iniciais”, ou seja, para startups que não estão preparadas para entrar no programa de aceleração. Com isso a aceleradora cria um programa de pré-aceleração através de organizações parceiras.

8 Posicionamento

Na tabela abaixo, são apresentadas as semelhanças e diferenças em relação às lições aprendidas e ações recomendadas nas decisões sobre o local em que o programa é executado.

Ação Semelhanças Diferenças
1) Escolha do local Há diversos modelos em avaliação, desde posicionar a aceleradora dentro do prédio da corporação até mantê-la em outra cidade. A opção por manter a aceleradora dentro do prédio da corporação tem a vantagem de permitir que o gestor se foque apenas na aceleração das startups, deixando questões operacionais da estrutura física para a corporação administrar.
2) Ambiente inspirador Um ambiente diferenciado do restante da corporação inspira, atrai clientes e parceiros. O desafio dos espaços compartilhados entre startups é o ruído decorrente do fluxo de pessoas.

 

8.1 Modelos distintos para a escolha do local: A decisão da escolha do local em que a aceleradora corporativa seguiu três modelos distintos. Uma das opções foi ficar fora do prédio da corporação, para não criar dependência, mas ainda assim, a aceleradora permanece perto de unidades da empresa, com isso, a corporação visava “permitir a troca entre os nossos colaboradores e as startups”. Nas palavras do empreendedor que esteve nessa aceleradora “a proximidade é excelente, porque se fosse junto, no mesmo prédio, seria pior, ia gerar uma certa dependência, mas ao mesmo tempo é no mesmo quarteirão”. Por outro lado, para minimizar o tempo gasto com a gestão da estrutura física e poder focar em cuidar de startups, pode-se optar pelo próprio prédio da corporação. A permanência em um local distinto da corporação, pode demandar muito tempo resolvendo problemas operacionais. Além disso, a proximidade da aceleradora corporativa pode “contaminar” positivamente a corporação. Por outro lado, um empreendedor preferia que o prédio fosse separado da corporação, pois enfrentou alguns problemas como: “…para você poder usar o auditório você tem que agendar com quarenta e cinco dias de antecedência”. Em outra situação a aceleradora fica fora da corporação, em outra cidade, porque o ecossistema de inovação na sede não é tão desenvolvido. Na escolha da cidade foi considerada a presença da “…academia, assim atrai pessoas do Brasil todo, uma capital criativa, espaços de coworking…”, o que facilitaria a contratação de profissionais de TI e profissionais de fora da cidade. Sobre ficar dentro da própria corporação, “nunca foi uma opção, justamente para não contagiar o futuro da startup”. Portanto, essa questão não tem um único modelo recomendado.

8.2 Ambiente inspirador mas com o desafio do ruído: As corporações adotam um ambiente diferenciado, inspirador, que atrai clientes e parceiros para realizar reuniões no escritório da própria aceleradora, reduzindo a necessidade de deslocamento dos empreendedores. O desafio dos escritórios compartilhados é fazer com que o ruído derivado do fluxo de pessoas não atrapalhe o dia-a-dia. Um dos empreendedores mencionou que “apesar do número e fluxo de pessoas, é um ambiente que dá para trabalhar, não é muito bagunçado, não é muito barulho, e enfim, todo ambiente propicia”, já outro empreendedor afirmou que, as vezes, tinham problemas de ruído. O ambiente também foi considerado bom simplesmente pela “interação com as outras startups, se a gente tem um problema a gente olha para a mesa do lado e pergunta para alguém que ajuda a resolver”.

* Franklin Ribeiro atua como gestor no Parque Tecnológico do Estado de São Paulo. É mentor e avaliador de startups no Programa Inovativa e também Mentor do Programa do BrazilLAB. Investidor através da GV Angels. Engenheiro de Computação pela Poli-USP, MBA pela FGV. Pesquisou sobre a relação startups e corporações no âmbito do mestrado pela FECAP.

Fonte: InovativaBrasil | Franklin Ribeiro*

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