BrazilLAB é destaque na Época Negócios: inovação é o caminho para um setor público mais eficiente

O Brasil entra neste tenso ano eleitoral de 2022 imerso como nunca em desafios internos e globais que exigem o entendimento de que é preciso atacar problemas públicos com novas abordagens. BrazilLAB é destaque na publicação
Em 13 de March de 2022

O BrazilLAB ganhou destaque na publicação de março de 2022 na Revista Época Negócios. Intiitulada "Inovação é o caminho para um setor público mais eficiente", a matéria traz um panorama geral sobre o que há de mais inovador ao redor do mundo na busca pela transformação do setor público. Um dos caminhos apontados também é maior a aproximação das Startups GovTechs dos governos. Confira abaixo a matéria na íntegra:

 

Inovação é o caminho para um setor público mais eficiente*

*Matéria publicada por Malu Delgado na Época Negócios.

O Brasil entra neste tenso ano eleitoral de 2022 imerso como nunca em desafios internos e globais que exigem o entendimento de que é preciso atacar problemas públicos com novas abordagens

O termo “wicked problems”, criado nos anos 70 para se referir a problemas com causas incertas, contraditórias e mutáveis, nunca foi tão atual. Isso é verdade nas empresas, mas também na governança global. Mudanças climáticas, aumento da desigualdade e, por fim, a pandemia de covid-19 apenas endossam a visão de que os principais dilemas no mundo se apresentam de forma cada vez mais complexa e, portanto, exigem novas maneiras de compreensão e enfrentamento coletivo.

A boa notícia é que, por trás de uma espessa, muitas vezes aparentemente intransponível complexidade — somada a uma dose muitas vezes crônica de burocracia e corrupção, começa a emergir uma nova forma de enxergar a gestão pública. Num movimento iniciado em países ricos, já com desdobramentos mundo afora, o caminho apontado para um setor público mais eficiente se apoia na mesma premissa que rege o setor privado: a inovação.

Uma das primeiras referências globais nessa área é o MindLab dinamarquês, considerado o primeiro laboratório de inovação no setor público, criado em 2002 (veja reportagem sobre a Dinamarca na pág. 58). A outra surgiu no Reino Unido, em 2007: o Nesta, originalmente criado nos anos 90 com um fundo nacional para promover a ciência e a tecnologia. Hoje se tornou um dos principais centros de estudos para inovação no setor público do mundo.

O ponto central de todos os esforços é o mesmo que causou nos últimos anos uma revolução na maneira como as empresas enxergam os clientes — e elevou ao patamar de sucesso as que os colocam no centro do desenho de seus produtos e serviços. Esses laboratórios começam a usar metodologias como ciências comportamentais e pensamento sistêmico para pensar no cidadão como o ponto de partida para a criação e análise de efetividade de políticas públicas.

É uma discussão que vai além das novas tecnologias que podem ser incorporadas para atingir esse objetivo, e gira em torno de metodologias inovadoras para repensar como as decisões são tomadas. “Inovação significa transformar ideias ousadas em realidade e mudar vidas para melhor”, diz Geoff Mulgan, CEO da Nesta de 2011 a 2019 e atualmente professor de inteligência coletiva, políticas públicas e inovação social da University College London (UCL).

No setor público brasileiro um marco dessa discussão ocorreu em 2016, quando uma parceria do laboratório de inovação do governo da Dinamarca com o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e a tradicional Escola de Administração Pública (Enap) floresceu para a criação do primeiro laboratório brasileiro, o Gnova. Em 2020, uma publicação do Enap intitulada “Ciclos de Vida de Laboratórios de Inovação Pública”, assinada por um coletivo de pesquisadores e gestores públicos, mostrou que há atualmente 43 laboratórios de inovação no país, em diferentes esferas (federal, estadual e municipal) e poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). “O conceito de inovação deve balizar qualquer governo”, afirma Diogo Costa, presidente da Enap.

Para especialistas, o assunto ainda está restrito no país à média burocracia. “Não é, de fato, uma agenda que vai entrar no discurso de candidatos à Presidência e ministros”, admite Pedro Cavalcante. Brasileiro, servidor licenciado do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Cavalcante escreveu vários livros e publicações sobre desafios da inovação no setor público brasileiro e, atualmente, é professor visitante de inovação da Universidade da Califórnia, em San Diego. O potencial da soma de iniciativas para o ganho de eficiência é gigantesco. Um estudo do McKinsey Center for Government (MCG) apontou que o aumento da produtividade dos governos do mundo poderiam ter economizado até US$ 3,5 trilhões por ano, nos últimos cinco anos, o equivalente a todo o rombo fiscal global.

Para o Brasil, que entra neste tenso ano eleitoral de 2022 imerso como nunca em desafios internos e globais que exigem da gestão pública, e sobretudo da classe política, o entendimento urgente de que é preciso atacar e gerir os problemas públicos com novas abordagens. Os exemplos a seguir — no Brasil e no mundo — apontam que existe uma solução para três problemas reconhecidamente crônicos na gestão pública.

  • Problema: Aproximar as ações do estado da realidade dos cidadãos
  • Solução: Cocriar políticas e serviços junto com os próprios usuários

 

Não existe cocriação sem ouvir o outro. Dentro dessa premissa, o 011.lab, criado dentro do governo municipal em São Paulo em 2017, tem se tornado referência na pesquisa da “linguagem simples”, metodologia que aplica o design thinking e outras ferramentas para que o poder público entenda a experiência do cidadão e aprenda a falar de um jeito que as pessoas consigam entender. Em 2020, o programa de Linguagem Simples ficou em 20 lugar no concurso de Inovação no Setor Público promovido pela Enap. Entre quase 300 projetos analisados, foi considerada a melhor experiência em municípios. Uma de suas aplicações aconteceu para melhorar o acesso ao portal da prefeitura e tirar dúvidas básicas, por exemplo, sobre o sistema de emissão de bilhete único para o transporte público da cidade. Em campo, os pesquisadores descobriram que o acesso exigia que o cidadão rolasse a tela do smartphone – principal via de acesso de boa parte dos usuários – até a letra T, de transporte e trens. E não B, de bilhete único. Além de não achar o serviço que procuravam na letra certa, muitos usuários não sabiam sequer fazer a rolagem na tela do celular até a letra T.

“Interagir com as pessoas diretamente e resolver o problema real delas ainda é dificílimo. A transformação do governo vai se dar a partir da transformação da prática do trabalho do dia a dia”, explica Vitor de Fazio, coordenador do 011.lab. A simples mudança de acesso às informações sobre o bilhete único trouxe economia. A prefeitura recebe, em média, 30 mil ligações por dia. Para cada uma paga R$ 4,50. Com a simples mudança de posição da informação sobre o bilhete único, o volume de pessoas que desiste de achar a informação no portal e liga para a central caiu 30%.

Outros estudos já mostraram que não é só a falta de letramento digital que pode atrapalhar. Motivações e incentivos sociais também afetam a tomada de decisão do usuário. É sobre isso que se debruça a ciência comportamental. “Temos o cidadão ideal e o cidadão real. O gestor público, quando faz política pública, geralmente pensa no cidadão ideal”, explica Guilherme Lichand, professor na Universidade Zurique, especialista em economia comportamental, professor do Insper no Brasil, consultor da ONU no Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e do Gnova, ligado ao Enap.

O cidadão real não leva em conta apenas custos financeiros e o risco de ser penalizado por determinadas atitudes. Existe uma preocupação com a imagem pública, uma influência balizada pelo comportamento de grupo.

Em um dos projetos que coordenou para os ministérios de Gênero, Educação e Assistência Social do Malawi, Lichand estudou o problema do casamento infantil. No país localizado no sudeste da África, esse dilema está diretamente associado à imagem pública dos pais e da família. Depois de fazer uma pesquisa, Lichand descobriu que os pais não apoiavam o casamento infantil. “Só 5% deles achavam que a idade ideal para a menina se casar era com menos de 18 anos. Ou seja, 95% achavam que não era para ter casamento infantil. Mas ainda assim 42% das meninas se casam no Malawi com menos de 18. Como pode o pai privadamente ser contra, mas publicamente agir como se fosse a favor?”, questionou o pesquisador.

Parte do problema era o medo dos pais sobre como seriam percebidos pela sociedade caso não autorizassem o casamento das filhas. “É uma cultura em que ter filhas é muito importante, e elas precisam começar cedo [a formar as famílias].” Com base nesta descoberta comportamental, a equipe de Lichand tentou dar visibilidade para outra atitude cultural muito bem-vista no país: doar. “Fizemos uma campanha nacional de doação de milho. Quem doava ganhava uma pulseirinha”, afirma. Um ano depois, já com o mérito de ter esse reconhecimento público, as famílias se sentiram mais confiantes em ficar com o ônus da decisão de adiar o casamento das filhas. Assim o casamento infantil nessas vilas caiu 30%. “Chamo essa pulseirinha de tecnologia, um meio de produzir novos resultados, e um meio que não estava disponível naquela comunidade”, diz Lichand.

  • Problema: Recursos escassos e burocracia
  • Solução: Criar hubs de inovação aberta

Recife é a primeira, e por enquanto única, cidade do país a fazer um chamamento público para Contratos públicos de Inovação (CPIs) com base no Marco Legal das Startups, aprovado em junho de 2021. A iniciativa da capital pernambucana faz parte de uma meta, adotada em 2020: digitalizar todos os serviços da administração municipal até 2022, facilitando a vida do cidadão. Para isso, criou-se uma Secretaria Executiva de Transformação Digital e um plano municipal de transformação digital. “O foco da transformação digital é simplificar essa relação do cidadão com os serviços da prefeitura”, explica Evisson Fernandes de Lucena, assessor da presidência da Emprel (Empresa Municipal de Informática de Recife) na área de Transformação Digital.

Nesse escopo de transformação, foi criado o Esquadrão de Inovação e Transformação Aberta, com o acrônimo (E.I.T.A), interjeição bastante usada pelos pernambucanos. O programa E.I.T.A! Recife, criado em 2021, lançou 12 desafios, em diversas áreas, sob a forma de perguntas. Entre eles: como diminuir a fome em nossa cidade de maneira escalável e sustentável? Como estimular a colaboração dos cidadãos para solucionar diferentes tipos de poluições ambientais do Recife? Depois de mergulhar no entendimento do problema, os inscritos criaram um MVP (Produto Mínimo Viável), protótipo de um produto ou serviço. O vencedor ganhou R$ 40 mil e um contrato de um ano com a administração municipal, no valor máximo de R$ 1,6 milhão.

“Antes, a gente achava que tinha um problema, achava que já sabia qual era a solução, especificava todo o termo de referência no edital”, diz Evisson Lucena. O ano de 2022 será o primeiro de experiência do programa. “Vamos ter indicadores, para saber se melhorou, avançou. Estamos desbravando. Pelo que já vimos de engajamento e pelas soluções apresentadas na etapa de ideação, tende a ser um grande sucesso.” No quesito de combate à fome, o vencedor foi o projeto Comida Invisível, que pretende conectar redes da sociedade, como fornecedores, bares, restaurantes, cozinhas comunitárias, restaurantes populares, entre outros, gerando soluções de negócios e evitando o desperdício de alimentos.

A mudança deve movimentar ainda mais o mercado brasileiro de govtechs. O relatório “As startups GovTech e o futuro do governo no Brasil”, realizado pelo BrazilLAB e o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), aponta que há 80 startups com atuação consistente junto com o setor público. Estima-se que pelo menos 1.500 startups nacionais teriam potencial para chegar ao mesmo patamar. Em países como Cingapura, onde 60% dos serviços digitais de alguma forma se utilizam dessas startups, o governo recentemente criou um curso de formação da próxima geração de empreendedores dessa área.

Outras iniciativas mostram que é possível incentivar a participação de mais partes além de startups. Curitiba foi a primeira cidade brasileira a integrar a rede FabCity Mundial. Inspirada na cultura maker, essa conexão global tem como objetivo estimular a produção local, autossuficiente, conectada e sustentável. Na prática, consiste na criação de centros de inovação capazes de oferecer recursos para a criação de inovações com o objetivo de resolver problemas sociais. O idealizador foi o urbanista venezuelano Tomas Diez, do Fab LabBarcelona (o primeiro da União Europeia), que criou a iniciativa em 2007. Os projetos são supervisionados pelo MIT (Massachussets Institute of Technology), nos Estados Unidos, e pelo Instituto Avançado de Arquitetura da Catalunha (IAAC), na Espanha.

Criado em 2019 e financiado integralmente pela prefeitura de Curitiba, o FabLab pertence à categoria social definida pelo MIT — há também as FabLabs industriais e as FabLabs acadêmicas. O projeto, segundo Cris Alessi, presidente da Agência Curitiba de Desenvolvimento e Inovação, está inserido num escopo mais amplo de inovação pública da administração municipal. “Trabalhamos com essa visão de empoderamento do cidadão e das instituições no conceito de inovação”, diz ela, que aposta na perenidade da cultura de inovação, independentemente do político que assuma a prefeitura. Um dos projetos, reconhecido pela ONU como exemplo no enfrentamento da pandemia de covid-19 foi a produção local de 20 mil faceshields, distribuídos entre agentes e profissionais da saúde no ápice da doença. As máscaras foram produzidas em impressoras 3D. Além de órgãos do município, empresas privadas se mobilizaram para a implantação da linha de produção. “É uma ação conjunta”, afirma Cris.

Outro exemplo do poder da mobilização surgiu em 2020, quando a Enap lançou uma chamada pública para selecionar projetos que se propunham minimizar os efeitos da covid-19. O desafio foi chamado de “SuperaCovid”. Apenas dois projetos foram selecionados, sendo um deles do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro). Mais conhecido no Brasil por ser um órgão regulador, que garante aos consumidores qualidade e segurança de produtos que chegam ao mercado, o Inmetro tem cerca de 30 laboratórios que trabalham com pesquisa e desenvolvimento, com equipamentos sofisticados.

De dezembro de 2020 a maio de 2021, usando metodologias de design thinking e design future, os pesquisadores do Inmetro, com a ajuda da Enap, tentaram desenvolver um produto que pudesse aprimorar a confiabilidade e o processo de fabricação de testes rápidos. Foi feito um protótipo de um Material de Referência Certificado (MRC) para ensaios sorológicos anti-SARS-CoV-2. O objetivo é que esse produto seja um aliado de fabricantes de produtos de diagnóstico e de laboratórios para avaliar o desempenho de seus próprios testes.

“As empresas precisam de um padrão, que alguém diga se elas estão medindo corretamente ou não. E é aí que o Inmetro entra”, explica Taynah Lopes de Souza, chefe da Divisão de Inovação Tecnológica (Ditec) do Inmetro. O tema biológico tem trazido questões novas para todo o mundo, segundo ela, e a covid-19 tornou ainda mais urgente a busca por soluções para padronizar medições do sangue humano. Além do uso nos testes testes rápidos de covid, esse Material de Referência Certificado também poderá ser utilizado para outras doenças com diagnóstico sorológico complicado, como dengue, chikungunya e febre amarela.

O Inmetro aguarda um financiamento de R$ 500 mil para fazer o produto. “Se conseguirmos o financiamento, vamos gerar um enorme avanço para a ciência no Brasil na área biológica. Temos tudo para liderar isso no mundo. Porque há uma corrida mundial”, acrescenta a chefe do Inmetro.

Para o Inmetro, o apoio do setor privado é fundamental. “Problemas públicos complexos exigem investimentos muito altos, com os quais o setor privado não tem como arcar sozinho. Essa relação tem todo o potencial de ser o ‘casamento perfeito’, por meio da chamada inovação aberta”, diz. O projeto contou com apoio da Câmara Brasileira de Diagnóstico Laboratorial (CBDL) e da Associação Nacional de Empresas de Biotecnologia (Anbiotec). “Historicamente temos os produtos que vêm de fora. A pandemia trouxe o senso de urgência para que possamos ter validações e parâmetros produzidos no Brasil”, explica Vanessa Silva, presidente executiva da Anbiotec, que reúne 63 associados, entre grandes indústrias, laboratórios e fabricantes nacionais de diagnóstico in vitro e de reagentes.

  • Problema: Falta de continuidade de políticas
  • Solução: Metas de longo prazo

Em 2017, o Espírito Santo foi o primeiro estado do país a criar um sistema estadual de avaliação e monitoramento de políticas públicas, gerido pelo Instituto Jones dos Santos Neves, criado nos anos 70 para produzir conhecimento e subsidiar políticas públicas.

“Temos um ciclo de avaliação de programas, relacionados a temas estratégicos de governo”, explica Daniel Cerqueira, diretor presidente do Instituto Jones, doutor em economia, conselheiro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e criador do Atlas da Segurança Pública.

Funcionário do IPEA cedido ao governo do Espírito Santo, Cerqueira estuda desde o final da década de 90 a segurança pública sob a perspectiva do setor público. Os governos que vão avançar para assegurar a tranquilidade social, assegura ele, são os que compreenderem todos os elementos que podem trazer mais eficácia do uso do recurso público para evitar crimes no futuro. “A literatura diz que é muito mais efetivo investir na primeira infância, de 0 a 6 anos, quando a criança desenvolve capacidades socioemocionais e cognitivas. Isso já foi estudado em vários países do mundo, inclusive nos Estados Unidos. Para cada US$ 1 que você investe em programas como esses gera benefícios para a sociedade não apenas de diminuição de números de crimes lá na frente, mas de aspectos sociais muitos mais importantes do que tecnologia.”

Como as temáticas são transversais em políticas públicas, Cerqueira agora está à frente de um projeto para unificar dados do Estado que permitam definir ações na segurança. Citando o exemplo das crianças, o Estado se depara com a seguinte questão: mas onde estão essas crianças? O que fazem suas famílias? O censo do IBGE é decenal, recorda Cerqueira. E caro. Só que os governos, seja federal, estadual, seja municipal, possuem inúmeras informações sobre os cidadãos que “estão em algum canto, alguma prateleira, algum computador perdido por aí”. “Fazer inovação é, antes de tudo, fazer um sistema integrado de informações para que a gente possa fazer um diagnóstico. Os países nórdicos e a Holanda, por exemplo, fazem isso desde a década de 80. Não fazem mais censo demográfico, como o do IBGE. E por quê? Porque foram integrando as informações dos registros administrativos com qualidade.”

A organização de dados requer uma luta, diz o economista. Exige mudança de cultura organizacional e um claro comprometimento das altas autoridades do Estado. O governo estadual pretende aprovar uma lei, ainda neste ano, para regulamentar os parâmetros para a integração de dados, respeitando os limites da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados). Numa primeira fase, o Instituto Jones vai tentar organizar e cruzar duas bases de dados: segurança e saúde. “Vamos integrar a base de dados de morte violenta pela polícia e morte violenta pela saúde. Queremos entender melhor e integrar essas duas fontes.” Se der tudo certo, no futuro, será criteriosamente mensurado e os impactos avaliados para a geração de ações do governo.

Não à toa a inovação muitas vezes é “pouco ou nada sexy” para políticos, na opinião do colombiano Juan Felipe Yepes González, do Departamento Administrativo de Função Pública do governo da Colômbia. A razão, segundo ele, é que não raro, no setor público, prevalece a agenda de curto prazo. Além de atuar na formação de 8.300 servidores públicos colombianos em abordagens inovadoras e de ter assessorado os processos de inovação no delicado e bem-sucedido momento de negociação com as Farcs, a guerrilha armada no país, no final da década passada, Juan Felipe atualmente integra o time de inovação da prefeitura de Bogotá, financiado por um projeto da Bloomberg Philantropies. Resolver problemas complexos, no entanto, exige consistência no longo prazo. A recompensa não vem logo mas pode representar um capital político para quem tem paciência.

 

SOB NOVA GESTÃO

Algumas das principais abordagens que começam a se tornar mais usadas em experiências de ponta no setor público.

Ciências comportamentais

Usada sobretudo para aumentar a eficiência de políticas públicas, combina insights da psicologia e ciências sociais. Parte do princípio de que fatores culturais, religiosos e morais afetam as decisões do cidadão e, por isso, é preciso ouvir as pessoas e entender seus dilemas e ações.

 

Design thinking

O conceito amplamente usado nas empresas segue a mesma lógica no governo, com soluções centradas na “jornada do usuário”. A ideia é identificar a experiência do cidadão com determinado serviço público e identificar oportunidades de melhoria.

 

Desenho de futuro

É a capacidade de prever e antecipar possíveis futuras demandas dos cidadãos que devem ocorrer. É um exercício de planejamento, mas a tecnologia também pode ajudar. A startup Farad.ai, da Inglaterra, por exemplo, usa inteligência artificial e aprendizado de máquina para prever o pico de consumo das redes regionais para ajudar as distribuidoras a controlar, com mais precisão, o fornecimento de energia.

 

Pensamento sistêmico

Os problemas contemporâneos são múltiplos e interligados, envolvendo aspectos econômicos, sociais e ambientais. É preciso analisar todas as questões que estão interconectadas a um problema público, como no caso das migrações em massa que podem ser causadas por desastres naturais.

 

TRÊS PASSOS PARA UM GOVERNOMAIS DIGITAL

*Matéria publicada por Karina Pastore na Época Negócios.

A inglesa Tanya Filer, uma das principais estudiosas do ecossistema global de govtech, fala a Época NEGÓCIOS sobre como impulsionar o setor no Brasil.

Melhorar a qualidade de vida dos cidadãos. Esse propósito pautou a vida acadêmica e a carreira profissional da inglesa Tanya Filer. Na busca por ajudar na construção de Estados transparentes, democráticos e sustentáveis, a partir da transformação digital do setor público, ela fundou a consultoria StateUp, um prestigioso centro de estudos sobre o ecossistema govtech global. Os trabalhos da empresa estão baseados nas informações levantadas por pesquisadores da Nebula, base de dados, cujo portfólio reúne 450 das mais importantes govtechs do mundo — do Reino Unido ao Brasil, da Letônia aos Estados Unidos, da Arábia Saudita à Venezuela. Como Tanya costuma dizer, a Nebula é um produto em constante desenvolvimento. Segue o ritmo da renovação tecnológica do setor público, aceleradíssimo nos dias de hoje. Veja, a seguir, os principais trechos da entrevista de Tanya para Época NEGÓCIOS.

 

Impulso ao ecossistema

“Há um pequeno grupo de investidores brasileiros que começam a olhar para esse setor, como as gestoras KPTL e Astella. Os governos têm de garantir oportunidades para os diversos empreendedores que desejem fazer negócios com o poder público, o que envolve novas formas de parcerias com o setor privado.”

 

A serviço dos cidadãos

“A crise sanitária deflagrada pela covid-19 mostrou como as tecnologias digitais são cada vez mais cruciais para os governos. Não apenas para realizar seus próprios processos internos como também para servir a população. Sempre consideramos as grandes necessidades do público como nosso ponto de partida para melhor compreender como a tecnologia pode melhorar a vida dos cidadãos. Em vez de começar com uma “solução” descontextualizada, é importante começar perguntando quais são as grandes necessidades públicas que os governos e suas comunidades estão enfrentando e quais resultados são desejáveis.”

 

Confiança na relação

“A mudança sempre traz consigo uma série de incertezas. Persuadir os cidadãos de que a mudança é para melhor exige necessariamente tempo, esforço e, em última análise, evidências de melhores resultados. Programas de digitalização eficazes não apenas exigem a confiança do público como também podem estreitar os laços entre os cidadãos e entre eles e as instituições governamentais. Isso começa com o envolvimento da população e o desenvolvimento de uma compreensão genuína de suas necessidades, objetivos e ambições. Felizmente, há hoje em dia um grande número de startups ajudando as organizações públicas a se envolverem com os cidadãos nas principais questões de governança de nosso tempo — da saúde às mudanças climáticas. Fazer com que os cidadãos se sintam ouvidos é uma ferramenta importante para lidar com a desconfiança política e o sentimento antitecnocrático que leva os cidadãos em todo o mundo a se posicionar contra o sistema. Obviamente, esse processo deve levar em consideração a grande exclusão digital que muitos países enfrentam. As oportunidades de engajamento off-line também são extremamente importantes. Caso contrário, a digitalização ameaça semear ainda mais desconfiança.”

Confira a matéria na íntegra no site da Época Negócios.

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