Há cerca de um ano, o BrazilLAB e o Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio realizaram a primeira convenção internacional de GovTech no Brasil. De lá para cá, os debates em torno da transformação digital do setor público vêm ocupando um espaço cada vez maior nas agendas de gestores públicos, empreendedores e representantes do terceiro setor.
O Encontro Internacional de Inovação em Governo é prova disso. Realizado no centro histórico de São Paulo, pelas Secretarias de Inovação e Tecnologia e de Cultura da Cidade, em parceria com o 011.lab, o Laboratório de Inovação em Governo do município, o evento conectou profissionais que trabalham em agendas de fronteira na gestão pública. Foram três dias de uma programação intensa, com palestras, painéis, oficinas e troca de experiências de atores do governo e de fora dele.
Letícia Piccolotto, presidente executiva da Fundação BRAVA e fundadora do BrazilLAB, participou de uma das mesas, intitulada “Como o investimento social privado pode ampliar o impacto na inovação governamental?”. Acompanharam-na Marcelo Cabral, do Instituto Arapyaú, Eloy Oliveira, do Instituto República e Georgia Pessoa, do Instituto Humanize. A mediação foi de Fernando Nogueira, do MobiLab+.
Em sua fala inicial, Letícia destacou a importância do envolvimento do setor público na transformação pela qual o Brasil precisa passar. “Isto porque o investimento social privado tem limites. Então, o Governo precisa tomar a dianteira para que os programas implementados não sejam ‘desplugados’ mais pra frente. É preciso haver continuidade.”
Ela ressaltou que o modelo de alianças tem contribuído para essa mobilização. “A Fundação Brava vem focando muito na agenda do governo digital e temos trabalhado sempre por meio de parcerias. Por exemplo, agora montamos uma aliança com o setor público ao lado do Humanize e do Arapyaú.”
Todos os participantes enfatizaram o papel de atores não governamentais para que a transformação digital de governos ocorra, principalmente no sentido de construir pontes entre as esferas pública e privada. Georgia Pessoa deu o exemplo do uso de open data. “O que o governo tem feito traz um ganho enorme para o setor privado e para o terceiro setor. Esse uso de dados abertos pode ser um instrumento de transformação, mas é preciso compartilhar ensinamentos. Por exemplo, o TCU faz um trabalho primoroso de design thinking. Precisamos aproximá-lo do setor privado, assim como o setor privado precisa ‘contaminar’ o setor público com boas práticas de inovação.”
Letícia Piccolotto destacou os exemplos que vêm de fora. “No evento GovTech Brasil, trouxemos cases de sucesso de outros países. Todos comentaram sobre a cooperação entre setor público, privado e terceiro setor. A inovação na Estônia não aconteceu por conta própria, houve vontade política e cooperação”.
Sobre o que “não fazer” na relação com o setor público, Marcelo Cabral compartilhou um importante aprendizado: o descompasso de agendas. “Se nós, do terceiro setor, chegamos ao poder público com uma agenda nossa, vai dar errado. É a receita do insucesso. A gestão pública tem inúmeras particularidades e um grande número de pontos de veto, é preciso considerar isso ao elaborar uma agenda de trabalho.”
Eloy Oliveira concordou. “Sejamos empreendedores ou agentes do terceiro setor, não podemos chegar com uma solução pronta, com tudo arranjado de cima pra baixo. A postura tem que ser outra, de querer ajudar, de construir juntos”.
Para Letícia, o engajamento de agentes do setor público é indispensável para que a relação perdure. “Quanto antes, melhor. Quanto mais gente mobilizamos desde o início, quanto mais servidores estiverem envolvidos, mais bem-sucedido será o processo. Agora, quando não conseguimos registrar as melhores práticas dentro do governo, quando não houve compartilhamento, os programas acabaram se perdendo”.
Sobre modelos de investimento social privado, Fernando Nogueira lembrou o caso “messiânico” de Mark Zuckerberg que, em 2010, doou 100 milhões de dólares para uma fundação de Newark (EUA) para reerguer o sistema escolar da cidade. Mas, de acordo com o Prefeito atual, os recursos não foram bem usados e a iniciativa naufragou.
De acordo com Letícia, o risco dessa visão de “salvador da pátria” existe em qualquer lugar. “Mas os problemas são tantos, os desafios são tantos, que o diálogo precisa ser contínuo. A legitimidade do terceiro setor está aí, na nossa boa intenção, no nosso propósito de contribuir pro país. Acredito que esse modelo de alianças, com investimentos estratégicos e não pontuais, seja o caminho para resultados mais perenes”.
Marcelo Cabral lembrou que, seja qual for o modelo adotado, para que o projeto seja duradouro e transformador, o compliance é indispensável. Também é necessário um conjunto de evidências de que o trabalho dá resultados, porque isso confere legitimidade.
Para todos os participantes, sem documentação, não haverá continuidade de programas. “É tarefa das instituições públicas de dar continuidade. E ter algum tipo de registro legal, alguma legislação contribui demais para isso, porque aí fica difícil alterar ou descontinuar”, afirmou Marcelo.
Letícia reiterou a importância de mobilização dentro do próprio setor público. “Ter pessoas dentro do governo que acreditem e coletar evidências são o caminho. O processo de inovação é contínuo, estaremos sempre buscando o próximo passo. E o cidadão tem que ser o ponto focal de qualquer política pública”, concluiu ela.
O BrazilLAB vem buscando formas de facilitar a contratação de tecnologia pelo setor público, sendo sua última iniciativa a criação do Selo GovTech, que certifica startups como capacitadas e aptas a trabalharem e venderem para diferentes órgãos do governo. Ao ser aprovada no processo e obter o Selo GovTech, a startup passará a fazer parte de uma rede de empreendedores que possuem soluções tecnológicas para diversos desafios dos governos! Clique aqui e saiba mais.