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Por que o Brasil precisa das startups – e de um governo digital

Setor público do Brasil sofre com excesso de burocracia, pouca flexibilidade e processos muito lentos
Em 29 de October de 2018

Portal Sollicita, destinado a profissionais que trabalham com contratos e licitações, procurou o BrazilLAB para uma entrevista sobre o tema inovação. Na reportagem, a fundadora Letícia Piccolotto explica como funciona a relação entre startups e a prestação de serviços para órgãos de governo. Confira o artigo na íntegra:

 

Startups: o Brasil precisa delas

Lei 8.666/93 é o maior desafio

 Hoje no Brasil existem 6.332 startups registradas, segundo dados da Associação Brasileira de Startups - ABStartups. Uma startup tem como objetivo criar e oferecer soluções para um problema ou melhorias com ferramentas inovadoras, tecnológicas e de baixo custo.Em tese é tudo que o governo brasileiro precisa, ou seja, de mais inovação e soluções e menos burocracia e problemas em todos os setores.

Na página inova.gov ligada ao governo federal, parcerias já vem sendo feitas entre o setor público, com 66 órgãos participantes; o setor privado com 18 facilitadoras de startups; o terceiro setor com 9 instituições e 4 universidades participantes no setor acadêmico.

Mas, para falar em inovação é preciso falar de necessidades. Então qual é o maior desafio de inovação nas instituições públicas? E como as startups podem de fato ser aliadas do governo nesse processo?

Letícia Piccolotto, fundadora do BrazilLAB - uma organização que conecta startups ao poder público, afirma que existem duas grandes barreiras à inovação no poder público.

“A primeira, é a barreira legal, que acaba bloqueando novas práticas e novas abordagens na solução de desafios enfrentados por gestores públicos – e que também se apresenta no excesso de regulamentação sobre certas atividades e setores, gerando uma sobreposição de normas jurídicas. A segunda barreira é cultural, relacionada à atuação dos agentes públicos”.

Segundo ela, existe pouco estímulo para agir de forma diferente nesse setor, em função da complexidade das tarefas desenvolvidas ou porque elas já são desenvolvidas há anos da mesma forma.

“Outros fatores que agravam esse comportamento é a mudança de lideranças e o risco de responsabilização pessoal se alguma solução inovadora for tida como ilegal por órgãos de controle. O setor público brasileiro ainda sofre muito com o excesso de burocracia, a pouca flexibilidade e osprocessos demorados para a maioria dos serviços. Modernizá-lo, tornando-o mais ágil e eficiente, é um grande desafio, claro, mas o ambiente das startups é fértil para buscar essas soluções – já que esse é um modelo de negócio pautado justamente pela busca de inovações que custem menos e agilizem rotinas”, informa.

 

Licitações de startups

Letícia aponta que o maior obstáculo atual para a contratação de startups pelo setor público é a Lei 8.666/93.

“O problema é que, como o número após a barra indica, a lei foi promulgada em 1993, quando a situação era completamente outra. Da forma em que foram apresentadas na legislação, as modalidades de licitação não dão conta de absorver serviços de startups”, enfatiza.

Atualmente são essencialmente quatro as modalidades que mais se relacionam às startups:

  • Contratações até R$ 80 mil: “Convite”. O gestor convida, por meio de carta, três concorrentes para atender a uma demanda específica;
  • Contratações de R$ 80 a 150 mil (ou R$ 650 mil, em alguns casos): “Tomada de Preços”. Nessa modalidade, os interessados devem qualificar-se de acordo com uma série de parâmetros.
  • A partir de R$ 150 mil (ou de R$ 650 mil, em alguns casos): “Concorrência”. Processo mais sofisticado, em que os participantes devem preencher um conjunto muito maior de requisitos.
  • Concurso: quando se pretende encontrar a melhor solução a partir de critérios de avaliação previamente informados pela Administração Pública.

 “O cenário todo dificulta a contratação de uma startup – como dificulta o processo de modo geral. O Brasil ocupa hoje o 125º lugar no ranking do Banco Mundial que avalia a facilidade de se fazer negócios. O tempo médio para abertura de uma empresa, seja de qual natureza for, é de 79 dias (enquanto na Estônia, por exemplo, é possível abrir em 15 minutos). Nesse sentido, a construção de governos digitais precisa passar por diversas evoluções. Por exemplo, é importante começar pelo básico e fazer com que a internet chegue mesmo a todos os cidadãos – pois não adianta criarmos uma administração digital que exclua pessoas (no Nordeste do Brasil, hoje, 42% das pessoas não têm acesso à rede)”, reflete Letícia.

Mas existem caminhos. Letícia contou que muitos deles foram comentados e debatidos no evento “GovTech”, conduzido pelo BrazilLAB e parceiros nacionais e internacionais em agosto/2018. “Depois dele, uma Agenda Digital foi criada para conduzir prefeituras, governos estaduais e governo federal na abertura de espaço para as soluções trazidas pelas startups”, conta.

 

Casos de sucesso

O BrazilLAB foi o facilitador do projeto CUCO Health e a cidade de Juiz de Fora (MG).

"O CUCO é um aplicativo gratuito de engajamento de pacientes em tratamentos médicos. Como uma enfermeira digital presente o tempo todo, ele leva conteúdo para educar as pessoas sobre a condição crônica e alertas para lembrá-las dos compromissos de saúde, como medicamentos e medições (e trabalha com motivação para incentivar os pacientes mais engajados). Com a aceleração promovida pelo BrazilLAB, o CUCO hoje funciona em uma parceria-teste junto à cidade mineira de Juiz de Fora como um auxiliar do sistema público, reduzindo despesas assistenciais com pacientes crônicos, por exemplo, e incentivando a saúde da população”, cita Letícia.

 

A relação perfeita

Para a empreendedora, o que precisamos hoje é que o cidadão seja o foco principal dos processos, que tanto governos quanto fornecedores o vejam como um cliente que precisa ser bem atendido.

“Os governos precisam de processos mais ágeis, de uma apuração de dados e resultados mais precisa, de novos processos que “encurtem caminhos”. O governo se beneficia dessa relação de uma série de formas – a começar por um serviço prestado de maneira mais eficiente e que atenda às pessoas com qualidade e que evite desperdícios. Esse precisa ser o mote: governos que representem e sirvam à sociedade de maneira legítima e eficaz e sem esquecer dos termos econômicos. Porque é importante frisar: uma boa estratégia digital pode trazer 5,7% de aumento do PIB anual, economizar até 97% dos custos de atendimento e serviços públicos e inserir na economia digital 63,3 milhões de brasileiros que atualmente não acessam a internet (dados do Pnad/IBGE 2016)”, informa.

 

Brasil e o Mundo

Em relação a outros países o Brasil ainda precisa avançar no processo.

“No caso do BrazilLAB, nesse momento a meta é destravar a parte jurídica e a regulação sobre as relações entre startups e o poder público. Isso porque, para a inovação ocorrer em larga escala, precisamos de um ambiente jurídico mais propício e mais seguro – tanto para receber ideias quanto para levá-las em frente”, destaca.

 

O BrazilLab

Como um “conector”, o BrazilLAB atua em duas frentes.

“Ao lado dos empreendedores, identifica as melhores tecnologias que possam ser adaptadas a uma estratégia para governos por meio do programa de aceleração anual; e, depois, apresenta as soluções a gestores que se coloquem como “earlyadopters”, que entendam e aceitem as ideias de inovação pela via tecnológica. A cada ano, o BrazilLAB lança editais com desafios diferentes para os candidatos. Na primeira, em 2016, o objetivo eram soluções para as áreas de Educação, Sustentabilidade Ambiental e Saúde.Na segunda edição, em 2017, o programa focou nas áreas de Comunicação, Agricultura Urbana e Equilíbrio Fiscal (foram 15 startups selecionadas e o valor de premiação passou a R$ 50 mil). O programa de aceleração 2018 se voltou para Meio Ambiente, Gestão de Pessoas, Saúde, Inclusão, Educação Empreendedora, Segurança Pública e Cybersegurança. O prazo das inscrições já foi finalizado – e, em 2019, basta acompanhar as redes sociais do BrazilLAB para se atualizar sobre os editais”, conclui Letícia.

 

Para saber mais: www.sollicita.com.br

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