Para comemorar o Dia Internacional da Mulher, a equipe do BrazilLAB teve um bate-papo com a fundadora da ONG, Letícia Piccolotto Ferreira, para saber um pouco mais sobre a sua visão a respeito dos desafios que as mulheres ainda enfrentam para conciliar aspirações, carreira, empreendedorismo e maternidade.
Equipe BrazilLAB – Letícia, ao longo da sua trajetória profissional, quais foram os principais desafios que você viveu como mulher?
Esse ano eu completo 20 anos de carreira. Comecei trabalhando no mercado financeiro e logo depois fiz uma transição para o terceiro setor, atuando em diferentes ONGs, tanto no Brasil quanto no exterior. No começo da minha carreira, o principal desafio que vivi foi o de ser respeitada, de ser ouvida, não só pelo fato de ser mulher, mas também pelo fato de ser muito jovem, pois sempre ocupei cargos de liderança.
Lembro que, aos 19 anos, me tornei Gerente de Marketing da Endeavor (ONG que fomenta o empreendedorismo no Brasil) e era responsável pela organização de conferências para mais de 400 empreendedores Brasil afora. Aos 25 anos, me tornei CEO da Fundação BRAVA e liderava reuniões com Governadores e Secretários de diferentes Estados.
É fato que tanto o ambiente do empreendedorismo quanto de governo são espaços de prevalência masculina. Então, o meu desafio foi sempre enxergar as coisas pelo lado positivo. Eu não me deixava abater frente a um clima mais hostil e não encarava isso como uma grande barreira. Sempre fui muito apaixonada pelo meu trabalho e me via em uma missão com uma grande oportunidade em mãos - de abrir espaço para outras mulheres que viriam depois de mim.
Equipe BrazilLAB – E quais são os principais desafios que você enfrenta como mulher no atual momento da sua vida pessoal e profissional?
Atualmente o meu desafio é conciliar a maternidade com a vida corrida de empreendedora e executiva. Tenho três filhos e tenho plena consciência de que esse é o papel mais importante que desempenho hoje, pois estou ajudando na criação e na formação de uma nova geração. É muita responsabilidade (risos)!
Mas em paralelo, estou à frente do BrazilLAB, ONG que criei há 3 anos com o objetivo de deixar um legado, um governo mais eficiente, moderno, disruptivo, ou seja, quero deixar um Brasil melhor para os meus filhos. Então eu não vejo como trabalho. Vejo como propósito de vida e é muito intenso também. Sendo assim, tenho procurado entender cada vez mais o que é estratégico para mim. O que eu posso e o que eu preciso delegar, tanto no trabalho quanto em casa. Este é hoje o meu maior desafio.
Equipe BrazilLAB – Recentemente a UNESCO divulgou um dado de que apenas 1/3 das estudantes do sexo feminino do mundo optam por seguir uma carreira relacionada à ciência, tecnologia, engenharia e matemática. Por que essas carreiras continuam sendo um desafio para as mulheres e o que você tem a dizer sobre isso, visto que está à frente de um programa que visa fomentar a inovação e novas tecnologias dentro do setor público brasileiro?
É muito triste observar que as mulheres continuam sub-representadas nessas áreas, especialmente na tecnologia. É difícil afirmar com 100% de certeza o motivo pelo qual muitas jovens evitam essas carreiras, mas lendo sobre isso e observando a realidade das empreendedoras que já passaram pela aceleração do BrazilLAB (nas três edições, apenas 30% dos empreendedores eram mulheres) vejo que um dos principais desafios ainda é a crença de que esses universos não foram feitos para nós. Os estereótipos podem parecer ultrapassados, mas estudos mostram que a imagem que o público tem de um cientista, por exemplo, não mudou desde os anos 1950.
Sendo assim, a família, os exemplos e o tipo de educação que as meninas recebem ou receberão no futuro fará toda diferença. Muitas das mulheres empreendedoras que eu conheci ao longo da minha carreira tinham pais empreendedores ou mães que sempre trabalharam fora e tinham certa independência financeira. Quanto às mulheres que conheço e que se envolvem hoje com programação ou são referência na área de tecnologia, sempre foram muito estimuladas pela família, amigos e professores a desenvolverem o lado da curiosidade, do raciocínio lógico, sem pensar muito se iam se encaixar depois em um ambiente considerado masculino.
Equipe BrazilLAB – E o que você acha que podemos fazer para mudar esse quadro?
Se pararmos para pensar os grandes empreendedores que conhecemos e que são amplamente divulgados pela mídia ainda são homens como Bill Gates, Mark Zuckerberg, Steve Jobs, Jeff Bezos, entre outros.
Precisamos estimular e dar luz a mais exemplos femininos, pois o mundo está mudando muito rápido. Estima-se que 90% das profissões do futuro exigirão habilidades justamente nessas áreas (tecnologia, biomedicina, entre outras); então eu vejo um risco muito grande para as mulheres se este cenário não for alterado rapidamente.
Eu sempre digo que as mulheres precisam ser protagonistas da revolução tecnológica que estamos vivendo e precisamos ocupar cada vez mais espaços relevantes nessa construção, não só como programadoras, cientistas, engenheiras, mas também como advogadas, juízas, mães e cientistas sociais que vão contribuir com debates importantes sobre os dilemas éticos que a nossa sociedade enfrentará (e já enfrenta!) com o advento de novas tecnologias. Na minha opinião o mundo precisará cada vez mais da sensibilidade feminina para superar esses desafios.
Equipe BrazilLAB - Quais são os conselhos que você daria hoje para jovens empreendedoras?
Eu diria que nunca duvidem de vocês mesmas. Procurem ser autênticas, tenham muita resiliência e se aproximem de outras mulheres que te inspirem. Eu sempre estive rodeada de mulheres fortes tanto em casa quanto no trabalho. Essas mulheres me inspiraram e me ajudaram a nunca desistir. Exemplos são muito importantes.