Quando se trata de repensar as cidades, o arquiteto e urbanista Peter Calthorpe dispensa apresentações. Seu nome é praticamente um sinônimo do chamado “novo urbanismo”, movimento sediado em São Francisco (EUA) que se organiza para promover práticas sustentáveis de planejamento e construção em cidades. Ele sempre defendeu a expansão inteligente dos centros urbanos -- e começou muito antes de isso se tornar uma tendência global, como é hoje.
Nesta apresentação do TED Talks, intitulada 7 princípios para se construir cidades melhores, Calthorpe sintetizou o seu pensamento e a sua visão. Trata-se de um material valioso não só para os interessados em arquitetura e urbanismo, mas para quem defende o desenvolvimento inteligente das cidades, incorporando novos pensamentos aos projetos de expansão. Em outras palavras, prato cheio para quem luta por mais inovação no setor público.
Peter Calthorpe começa com um dado impressionante: até 2050, teremos que construir cidades para 3 bilhões de pessoas -- “uma duplicação do ambiente urbano atual”. A conclusão é óbvia: caso isso não seja feito com cuidado de forma inteligente, “nem todas as soluções climáticas do mundo serão capazes de salvar a humanidade,” afirma.
Mas o que significa realizar essa expansão inteligentemente? De acordo com Calthorpe, isso significa evitar, a qualquer custo, a “expansão urbana desordenada”, que isola as pessoas, “segregando-as em enclaves econômicos e territoriais, isolando-as da natureza”.
Para ilustrar esse pensamento, o apresentador compartilha o projeto de expansão da Califórnia, conduzido por ele. A projeção é que, em 20150, a região conte com mais dez milhões de habitantes. “Simulamos uma série de cenários de crescimento para o estado,” conta ele, “misturando uma série de protótipos de desenvolvimento”.
Um cenário era de expansão urbana desenfreada, com mais do mesmo: shoppings, condomínios residenciais e centros empresariais. O outro cenário, denominado de “expansão inteligente”, foi marcado por um desenvolvimento mais compacto: bairros residenciais com pequenos comércios, vizinhanças onde se pode caminhar, prédios baixos mas integrados, ambientes de uso diversificado.
Neste segundo cenário, o eixo da transformação é o transporte público. A projeção de Calthorpe prioriza o sistema, inserindo-o ao longo dos canteiros centrais de avenidas (principalmente ônibus e VLTs). Além disso, “diversifica-se os espaços ao redor”, com uso variado dos quarteirões: comércio, empresas, espaços de lazer, etc. Com isso, afirma o urbanista, você torna a vizinhança mais complexa e mais interessante, o que facilita a realização de percursos a pé.
A comparação entre essas duas projeções traz resultados estarrecedores, de acordo com Peter Calthorpe. O primeiro cenário, de expansão desenfreada, quase que duplica a “pegada física” urbana, de uso da terra (e, consequentemente, de recursos naturais). Enquanto que, no segundo cenário, essa pegada se reduz a bem menos do que a metade.
Quanto à emissão de gases do efeito estufa, a diferença também é enorme. Porque, na Califórnia (assim como em SP e outras grandes cidades do país), os carros são os principais responsáveis por soltar carbono na atmosfera. E cidades que não dependam tanto de veículos reduzem fortemente essa pegada ambiental. Ou seja, mais espaço para pedestres e ciclistas, maior priorização do transporte público.
Calthorpe salienta que a expansão inteligente vai proporcionar, também, uma redução no orçamento das famílias californianas. Em relação à expansão desenfreada, a economia vai ser de até 10.500 dólares em 2050, tanto de combustível quanto em água e energia elétrica ou solar.
Projetar e comparar esses cenários, de acordo com Peter Calthorpe, permitiu que grupos diferentes percebessem o interesse comum que há na expansão inteligente. Construtoras e corretores imobiliários, ambientalistas e políticos: todos entendem os benefícios dessa expansão inteligente, e é isso que alavanca a verdadeira mudança.
Por isso, conclui o urbanista, Los Angeles decidiu tornar-se uma cidade orientada para o transporte público, para pedestres. “Desde 2008, o poder público local já destinou 400 milhões de dólares em títulos do governo para o transporte público -- e ‘zero dólares’ para novas avenidas”.
Ou seja, Los Angeles é a prova de que, quando os benefícios da inovação na gestão pública são evidentes para todos, a vontade política de realizá-la acaba sendo uma consequência natural.